quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Existe censura no Brasil? (Por Rapha Ramirez)

É a partir dessa pergunta que começa a coluna dessa semana. Traremos nas próximas linhas dados, informações e declarações de como os profissionais de imprensa olham para a censura hoje. E como o fantasma do autoritarismo e da falta de liberdade ainda está nas mentes e nos corações dos jornalistas, inclusive daqueles que nunca viveram a ditadura militar. Para agravar o quadro, existe também a chamada censura–consentida ou auto-censura.

A organização “Repórteres Sem Fronteiras”(RSF), em seu relatório anual sobre liberdade de imprensa, mostra o Brasil na 99o colocação, uma posição melhor do que em 2014 quando o país ocupava a 111o. Segundo a ong apesar da melhora, “a repressão a manifestações na América Latina é um problema crescente que acaba dificultando a cobertura da mídia, tanto no Brasil quanto em outros países”.

A lista, que vai até a 180o colocação, ocupada atualmente pela Eriteia na África. A RSF cita em seu relatório a morte de dois jornalistas e reitera, que a lei de imprensa utilizada na República Brasileira data da ditadura militar e deve ser revogada. Os países com mais liberdade são os europeus, em primeiro lugar está a Finlândia e, em segundo, a Noruega.

Citada pela RSF como um dos problemas para a liberdade de imprensa no Brasil, a “Lei de Imprensa” nº 5.250, de 9 de fevereiro de 1967, portanto em pleno período militar, foi criada pela presidência da República para regulamentar as manifestações de pensamento e de informação. E apesar de alguns artigos liberais como o que diz: “É livre a manifestação do pensamento e a procura, o recebimento e a difusão de informações ou ideias, por qualquer meio, e sem dependência de censura, respondendo cada um, nos termos da lei, pelos abusos que cometer”, o documento traz, também, tópicos que cerceiam a liberdade.

Como este, que fala o seguinte: “O diretor, principal responsável do jornal, revista, rádio e televisão, manterá em livro próprio, que abrirá e rubricará em todas as folhas, para exibir em juízo, quando para isso for intimado, o registro dos pseudônimos, seguido das assinaturas dos seus utilizantes, cujos trabalhos sejam ali divulgados”. Para o colunista de O Globo, Luiz Garcia, a lei de imprensa acaba tornado a censura governamental, porque através dela pode-se abrir processos contra jornalistas, com muita facilidade.

Segundo o repórter da Rede Globo de Televisão, André Luiz Azevedo, nem mesmo a lei de imprensa pode cercear os jornalistas. “No mercado atual, com consumidores atentos, opinião pública atuante e cobrança permanente não existe mais, pelo menos nos grandes centros que conheço, lugar para a manipulação de que se fala. Infelizmente, ou melhor, felizmente, a realidade não confirma essas teses conspiratórias”.

Eliane Cantanhede, do O Estado e São Paulo e da Globonews, tem uma opinião muito próxima da de André Luiz Azevedo. Para ela, a sociedade está amadurecida e, com isso, seus jornalistas e também a sua imprensa.

O ex-presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ), Sergio Murillo, hoje no conselho de ética da instituição, pensa diferente. Para ele, os meios utilizados pela ditadura foram substituídos por instrumentos sutis, mas igualmente devastadores do direito à informação. “Há uma liberdade formal, que beneficia na sua plenitude os grandes grupos de mídia. É fundamental que a sociedade passe a discutir e a reivindicar o direito à comunicação”, finalizou.

Arrematando a opinião de Sérgio Murillo, o pesquisador da Universidade de Brasília, Venício A. de Lima, em artigo publicado pelo site do Observatório da Imprensa, informa o seguinte: “Não é segredo para ninguém que a indústria das comunicações, apesar de crises financeiras localizadas, transformou-se num dos principais negócios das últimas décadas, e exemplo de concentração da propriedade no mundo globalizado.

Reduzida a alguns mega-grupos privados, tende cada vez mais a controlar o que vemos, ouvimos e lemos”, disse. Ao se contemplar o cenário que existe hoje, seria uma espécie de censura capitalista, que produz nos jornalistas um sentimento de auto-censura, e até de um consentimento de ser censurado. Segundo Bill Kovach e Tom Rosenstiel, em seu livro “Os elementos do Jornalismo”, hoje essa conglomeração ameaça a sobrevivência da imprensa como instituição independente, “já que o jornalismo se converte em um setor subsidiário dentro das corporações, essencialmente voltada para os negócios”.

Venício A. de Lima diz, ainda, citando a Veja, edição 1872 de 22 de setembro de 2004 que “no Brasil moderno, a ‘liberdade de expressão’ deixou de ser um direito natural e absoluto, passando a ser encarada como algo que – na avaliação de ministros do governo e de tribunais superiores (sic) – ‘é relativo’ ou exige ‘precondição para ser exercido’”. Para muitos não é assim. O diretor geral de jornalismo e esporte da TV Globo, Ali Kamel, em artigo publicado pelo jornal O Globo de 4 de outubro de 2005, acha que só existe o jornalismo onde há liberdade. “O que no fundo choca esses intelectuais não é a cobertura (...), mas a liberdade de cobrir”, afirmou.

O colunista do jornal O Globo Ilimar Franco concorda com Kamel. “Na minha experiência cotidiana, posso afirmar que a mão da empresa no trabalho dos repórteres não tem esse peso todo como pretendem alguns”. E critica: “Acredito que esse discurso é uma forma perversa de atacar uma categoria profissional que esteve ao lado do país em momentos cruciais da história recente, como a anistia, a convocação da Constituinte, a redemocratização e o impeachment”.

A opinião de Ilimar é paradoxal, já que há declarações, inclusive de políticos, de que “fulano tem grande abertura do jornal X, ou do jornal Y cuido eu”. Os governos de Lula e Dilma abriram espaço para essa discussão que aqui se trava. O tratamento de ambos e do PT junto à imprensa é muito ruim, e parece que não muda, mesmo depois de tantas críticas.

O deputado estadual e ex-secretário-geral do Partido dos Trabalhadores, Raul Pont, em entrevista ao Blog do Josias da Folha On Line do dia 22 de novembro de 2005, falou da popularidade do falecido presidente da Venezuela, Hugo Chávez, e aproveitou para novamente, em nome da legenda, criticar a imprensa. “Eu acho que a imprensa daqui bate até mais em nós (...). 

A nossa é mais radical contra o PT e o governo do que a imprensa da Venezuela contra Chávez”, afirmou. Claro que a imprensa brasileira tem excessos. Mas a grande maioria está noticiando o que sai do próprio governo, ou da polícia federal.

Apesar da presidente Dilma e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva defenderem que o país é livre e que a receita para o vigor do jornalismo é a liberdade, o cenário atual não se constrói assim. Muito pelo contrário: é erguido com vigas de isopor prestes a se desfazerem e cair. Em entrevista publicada pelo jornal O Globo, o colunista Arnaldo Jabor, da TV Globo e do jornal O Globo, resume muito bem tudo isso. “

A importância do jornal e da liberdade de imprensa é como instrumento na construção da cidadania e da comunidade. (...) Há muitos petistas no governo que de dia são neoliberais e de noite são leninistas. Metade do governo não quer a multiplicidade, querem o único. Querem evitar que a sociedade e os jornais defendam o país deste desejo de controle, de fiscalização”, alfinetou Jabor.

Para o ex-prefeito de Vitória, Luiz Paulo Vellozo Lucas, em entrevista à revista Agenda 45, “durante todos esses anos em que o PT se auto-atribuia o monopólio da ética na política, o Brasil deveria ter percebido a inspiração totalitária de seu projeto, seu desprezo pela democracia, sua descrença no funcionamento das instituições e na possibilidade de aperfeiçoá-las com reformas. Desde a luta armada, eles nunca acreditaram no jogo limpo”.








Rapha Ramirez tem 32 anos, é formado em Jornalismo pela Universidade Veiga de Almeida. Apaixonado por política, já está escrevendo o seu primeiro livro e em breve se lançará como Escritor. Caso queiram entrar em contato com ele, basta seguirem o seu perfil no Twitter em @rapharamirez.

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